"Venho da terra assombrada,
do ventre de minha mãe;
não pretendo roubar nada
nem fazer mal a ninguém.
Só quero o que me é devido
por me trazerem aqui,
que eu nem sequer fui ouvido
no acto de que nasci.
Trago boca para comer
e olhos para desejar.
Com licença, quero passar,
tenho pressa de viver.
Com licença! Com licença!
Que a vida é água a correr.
Venho do fundo do tempo;
não tenho tempo a perder. (...)
Que eu e a Natureza,
que a Natureza sou eu,
e as forças da Natureza
nunca ninguém as venceu.
Com licença! Com licença!
Que a barca se fez ao mar
Não há poder que me vença
Mesmo morto hei-de passar.
Com licença! Com licença!
Com rumo à estrela polar.
António Gedeão, "Fala do Homem Nascido", In Teatro do Mundo
(Imagem, Murat Aslankara, Water Game)
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